Crônicas do "Da C.I.A"

Thursday, May 15, 2008

2 anos do Silêncio: Editoriais

FOLHA DE SÃO PAULO:

"Não nos amedrontemos ( publicado em 16/05/2006, link original http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1605200601.htm )

A ofensiva de bandidos em nome da falange criminosa chamada de "Primeiro Comando da Capital" (PCC) mudou de padrão em São Paulo. Os ataques genéricos deixaram de alvejar apenas agentes da segurança pública e passaram a incluir ações com o objetivo de disseminar o pânico na população. Ônibus urbanos, incendiados às dezenas, foram tomados como emblema da tática intimidatória. Agências bancárias e uma estação de metrô também sofreram ataques.
Como conseqüência, a capital, que enfrentava o seu primeiro dia útil depois da crise do fim de semana, viveu ontem um dia atípico, de "meio expediente". Companhias de transporte público retiraram veículos de circulação, escolas cancelaram aulas, comércio e repartições públicas fecharam as portas cedo. Em meio a uma onda de boatos sobre toque de recolher, a hora do "rush" foi antecipada para o meio da tarde.
Há uma dupla pedagogia em curso nesses lamentáveis dias de outono. De um lado, a quadrilha dos presídios e seus seguidores fora das celas, diretos ou por inspiração, ensaiam dar um passo no rumo das organizações terroristas. Do outro, a população, especialmente a da Grande São Paulo, depara com uma situação inédita e é instada a desenvolver com rapidez novos padrões de reação.
É compreensível que, desacostumada a lidar com um ataque genérico de bandidos e mal orientada pelos governantes, grande parte dos paulistanos tenha quebrado a rotina, fugido das ruas e procurado abrigo em casa. Mas isso é tudo o que querem os delinqüentes que promovem a selvageria: que a população se dobre à tática do medo e recue, a fim de que possam desenvolver suas práticas criminosas com mais desenvoltura.
Para que o "aprendizado" da quadrilha sobre práticas terroristas não se complete, no entanto, é fundamental que as autoridades e a sociedade dêem um sonoro basta a essa afronta. Não é hora de recuar. Os governantes precisam transmitir confiança à população; devem dizer aos cidadãos que voltem ao trabalho, que voltem às aulas, pois a polícia vai assegurar a ordem pública, vai confrontar com força máxima e debelar, até o último integrante, os bandos que violentam o Estado de Direito.
O momento é decisivo. Ou reagimos com contundência -fulminando a crise imediata e dando seqüência a uma ofensiva contra o crime organizado sem precedentes na história do país- ou estaremos condenados a nos habituarmos ao terror.
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JORNAL DA TARDE:

"Na hora de dar o basta! ( publicado em 16/05/2006, link original http://www.jt.com.br/editorias/2006/05/16/opi-1.94.8.20060516.17.1.xml )

O transporte público não funciona, com os ônibus impedidos de circular diante da perspectiva de serem alvos da violência, e as estações de trens, entre elas as do metrô, evacuadas por idêntico motivo. O trânsito, normalmente difícil, tornou-se caótico, como nos dias em que há greves de ônibus, também porque a polícia tem sido forçada a fechar acessos importantes para dificultar a ação dos quadrilheiros que, desde a noite de sexta-feira, têm praticado uma série de atentados terroristas contra os agentes da lei e os mantenedores da ordem na cidade.
Por mais violentas que sejam as metrópoles brasileiras, nunca aconteceu algo semelhante antes entre nós. O mais apavorante é que a seqüência desses atentados e a escalada de brutalidade que os patrocina passam a convicção de que a atividade criminosa está demonstrando uma capacidade de organização impressionante. Ainda que a sociedade e a autoridade já tivessem visto provas prévias de que quadrilhas como esse tal Primeiro Comando da Capital (PCC) dispõem de armamento moderno e capacidade gerencial comparável a de empresas estabelecidas na praça. Até o momento em que este editorial estava sendo escrito, o PCC tinha liderado 77 mil presos em 80 rebeliões simultâneas em presídios paulistas e comandado de dentro das cadeias mais de 150 atentados contra postos, delegacias, quartéis, prédios públicos e estações de transporte, nos quais foram mortos a sangue-frio policiais civis e militares, entre os quais bombeiros.
Outro motivo de pânico para a população ordeira é que, pelo menos até agora, o Estado não tem contraposto a esse avanço e à ousadia por ele permitida um mínimo de ânimo e eficácia para deter a onda de barbárie que sacode a maior cidade do País. Não é sensato confundir iniciativa com controle. Os bandidos tomaram a iniciativa e, apesar de as autoridades terem cometido o erro elementar de dizer que já sabiam o que estava para ocorrer, não se pode afirmar que a tática terrorista de minar o moral dos agentes da lei executando-os em casa tornou a Capital paulista um simulacro do Rio de Janeiro, onde o crime organizado exerce controle territorial sobre várias favelas. Este, felizmente, ainda não é o caso. Mas ou o Estado restabelece a paz e a ordem ou São Paulo corre o risco de repetir o modelo carioca.
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ESTADO DE SÃO PAULO:

"A ofensiva terrorista do PCC ( publicado em 16/05/2006, link original http://www.estado.com.br/editorias/2006/05/16/edi120067.xml )

Nunca, na história do País, uma facção criminosa foi tão longe na afronta às instituições governamentais. Com grande poder de articulação nos 116 estabelecimentos prisionais paulistas, alvos estratégicos bem definidos em todo o Estado e com métodos terroristas, o Primeiro Comando da Capital (PCC) levou 77 mil presos a deflagrarem 80 rebeliões simultâneas, promoveu mais de 180 ataques a delegacias, quartéis, fóruns, bancos e transporte público e matou a sangue-frio mais de 40 agentes carcerários, policiais civis e militares.
O saldo trágico desse ataque, que ocorre três anos após o PCC ter assassinado o juiz-corregedor de Presidente Prudente Antonio Machado Dias revela o aumento, em escala e alcance, da ousadia - e da "competência profissional" - do crime organizado, que coloca na defensiva os responsáveis pela segurança pública que deveriam persegui-lo. Não se pode falar de surpresa. Tudo isso só confirma o que já se sabia desde a eclosão da megarrebelião promovida pelo PCC em fevereiro de 2001 em 29 prisões, ou seja, que o Estado brasileiro já não detém mais o monopólio do uso da força.
A fraqueza das instituições públicas frente ao crime organizado pode ser medida pelo rol de reivindicações impostas pelo PCC como condição para suspender seus ataques e pela petulância do advogado da organização. Além do direito a visitas íntimas nas prisões de segurança máxima, eles querem o fim do Regime Disciplinar Diferenciado (RDD). Por esse sistema, presos perigosos permanecem incomunicáveis em celas individuais, não têm acesso a jornais e televisão e só podem tomar sol algemados, durante apenas uma hora por dia. Segundo o advogado do PCC, Anselmo Neves Maia, se o governo estadual não acolher as reivindicações da facção e abrandar o rigor do RDD, "a tensão aumentará nos próximos dias". Nos países onde cadeia é vista como lugar de punição, esse causídico não poderia estar exercendo a profissão e criminosos condenados pela Justiça não gozam das regalias desfrutadas pelos presos brasileiros. Nesses países, a morte de um único policial por amotinados é respondida com o aumento do rigor no regime de encarceramento. No Brasil, contudo, onde há muito tempo a sociedade se tornou refém do crime organizado, o que tem prevalecido é uma absurda complacência com criminosos, traduzida em concessões de indultos e outros benefícios, o que lhes permite voltar às ruas após cumprir um sexto da pena.
Como exemplo dessa leniência, estão aí duas decisões judiciais, ambas tomadas poucas semanas antes desta ofensiva do PCC. Lembrada pelo promotor Rodrigo Pinto, chefe do Ministério Público estadual, a primeira decisão foi do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que considerou não ser "falta grave" a posse de celular nas prisões. A segunda decisão, do Supremo Tribunal Federal (STF), declarou inconstitucional alguns dispositivos da Lei dos Crimes Hediondos e permitiu a concessão do regime da progressão para seqüestradores e homicidas, justificando a decisão com base no princípio da "humanização da pena".
Além de decisões como essas, que em vez de aumentar o grau de certeza de punição, aumentam as apostas na impunidade, há ainda o anacronismo das leis processuais penais, cujos prazos e recursos permitem aos advogados do crime organizado retardar o julgamento - em muitos casos até a prescrição dos delitos -, e a inépcia do poder público, que perdeu o controle do sistema prisional para as organizações criminosas.
No plano estadual, o governo até hoje não conseguiu impedir o acesso de celulares nos presídios nem instalar um eficiente sistema de bloqueio. No plano federal, os investimentos na área da segurança foram reduzidos em 28%, entre 2004 e 2005, e o Congresso até hoje não se dispôs a modernizar leis ultrapassadas.
É por isso que a situação não pára de se deteriorar. Enquanto não for ampliado o sistema prisional, que tem um déficit de 135 mil vagas, não forem modernizadas as leis penais para aumentar o alcance das penas alternativas para crimes de menor gravidade e enquanto não se investir em inteligência para desarticular facções criminosas, as instituições policiais brasileiras continuarão se limitando a ações defensivas contra os ataques cada vez mais violentos do crime organizado.
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